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Gil Vicente - Auto da Barca do Inferno

  • Foto do escritor: Bigas
    Bigas
  • 28 de jun. de 2020
  • 8 min de leitura

Atualizado: 23 de jan. de 2021


O “Auto da Barca do Inferno” é um exemplo perfeito da sátira social de Gil Vicente aos costumes da sociedade portuguesa do século XVI, fazendo jus à fórmula latina «ridendo castigat mores» (a rir corrigem-se os costumes). Através de uma brilhante metáfora de um tribunal do pós morte, Gil Vicente põe a nu os vícios das diversas ordens sociais e denuncia a “podridão” da sociedade através das diferentes personagens julgadas, que, no fundo, não passam de arquétipos representativos das classes que integram: O Fidalgo representa a Nobreza; O Onzeneiro, a banca; O Parvo, o povo simplório; O Sapateiro, os comerciantes; O Frade, as ordens religiosas; A Brízida Vaz, aqueles que praticam negócios ilícitos e são dados a maus costumes; O Judeu, o povo judaico em si; O Corregedor e o Procurador, os juízes e os advogados, ou seja, a justiça; O Enforcado, os criminosos julgados que não se arrependem; e por fim os Cavaleiros, que representam a cavalaria e o exército, que lutava em cruzadas contra os mouros.


Gil Vicente

Introdução

O presente trabalho aborda a grande peça de Gil Vicente o Auto da Barca do Inferno e as suas relações com as criticas impostas na época à sociedade, mais concretamente a perseguição em massa feita aos judeus.

Esta organizado em três partes. Na primeira parte deste trabalho será abordado a obra e consiste a peça em um breve resumo. Na segunda parte abordo o personagem Judeu, as suas características e os argumentos do Diabo e do Anjo para decidir para onde ele iria.

A metodologia usada foi a pesquisa bibliográfica, a pesquisa na internet, enriquecida com alguns artigos tais como “Auto da Barca do Inferno” da RTP ensina e as indicações dadas pela professora nas aulas.

Trata-se de uma obra mais emblemática de Gil Vicente e que, após 500 anos da primeira edição, continua atual. Retrato fiel da nossa sociedade e uma excelente crítica à nossa moralidade e aos falsos-costumes, além disso é uma obra divertidíssima.

Biografia de Gil Vicente


Conforme descrito no site e Biografia (Frazão, 2019) , Gil Vicente (1465-1536) foi um dramaturgo e poeta português, o representante maior da literatura renascentista de Portugal antes de Camões. Criador de vários autos é considerado o fundador do teatro em Portugal.

Gil Vicente nasceu em Guimarães no ano de 1465. Por falta de documentos, muitos factos da sua vida não são claros, como o próprio local e ano de seu nascimento. Sabe-se que sua atividade de dramaturgo foi desenvolvida em torno da corte portuguesa, abrangendo os reinados de D. Manuel I e de D. João III

O nome de Gil Vicente apareceu pela primeira vez, em 1502, quando encenou a peça “Auto da Visitação” ou “Monólogo do Vaqueiro”, em homenagem ao nascimento do príncipe D. João, futuro D. João III, filho de D. Manuel I e de D. Maria de Castela. No monólogo, escrito em castelhano, um simples homem do campo expressa sua alegria pelo nascimento do herdeiro, desejando-lhe felicidades. A interpretação entusiasmou a Corte, iniciando assim sua carreira que se estendeu por mais de 30 anos.

Gil Vicente escreveu mais de quarenta peças, algumas em espanhol e muitas em português, onde criticou de forma impiedosa toda a sociedade de seu tempo.

De sua observação satírica não deixou ninguém de fora, papa, rei, clero feiticeiras, alcoviteiras, judeus, moças casadouras e agiotas. A galeria de personagens ridicularizados é extensa:

Gil Vicente faleceu em Évora, Portugal, no ano de 1536.

Bibliografia de Gil Vicente

Gil Vicente é geralmente considerado o primeiro grande dramaturgo português, além de poeta de renome. Há quem o identifique com o ourives, autor da Custódia de Belém, mestre da balança, e com o mestre de Retórica do rei Dom Manuel. Enquanto homem de teatro, parece ter também desempenhado as tarefas de músico, ator e encenador. É frequentemente considerado, de uma forma geral, o pai do teatro português, ou mesmo do teatro ibérico já que também escreveu em castelhano.

Obras Publicadas:

Auto da Visitação (1502)

Auto dos Físicos (1524)

Auto Pastoril Castelhano (1502)

Frágua d'Amor (1524)

Auto dos Reis Magos (1503)

Farsa do Juiz da Beira (1525)

Auto de S. Martinho (1504)

Farsa das Ciganas (1525)

Auto da Índia (1509)

Dom Duardos (1525)

Auto da Fé (1510)

Templo d'Apolo (1526)

Auto das Fadas (1511)

Breve Sumário da História de Deus (1526)

O Velho da Horta (1512)

Diálogo dos Judeus sobre a Ressurreição (1526)

Exortação da Guerra (1513)

Nau d'Amores (1527)

Auto da Sibila Cassandra (1513)

Comédia sobre a Divisa da Cidade de Coimbra (1527)

Comédia do Viúvo (1514)

Farsa dos Almocreves (1527)

Quem tem farelos (1515)

Auto Pastoril da Serra da Estrela (1527)

Auto dos Quatro Tempos (1516)

Auto da Feira (1528)

Auto da Barca do Inferno (1517)

Auto da Festa (1528)

Auto da Barca do Purgatório (1518)

Triunfo do Inverno (1528)

Auto da Alma (1518)

O Clérigo da Beira (1530)

Auto da Barca da Glória (1519)

Jubileu d'Amores (1531)

Auto do Deus Padre (1520)

Auto da Lusitânia (1532)

Comédia de Rubena (1521)

Auto de Mofina Mendes (1532)

Cortes de Júpiter (1521)

Romagem de Agravados (1533)

Auto da Fama (1521)

Amadis de Gaula (1533)

Pranto de Maria Parda (1522)

Auto da Cananeia (1534)

Farsa de Inês Pereira (1523)

Floresta de Enganos (1536)

Auto Pastoril Português (1523)

Auto da Barca do Inferno

1. Auto da barca do inferno

O “Auto Da Barca Do Inferno” ou Auto da Moralidade foi uma peça feita por Gil Vicente (1465-1536) que entre muitas obras feitas por o mesmo e reconhecidas até os dias de hoje. Essa peça foi escrita no Reinado de D. Manuel I

O “Auto Da Barca Do Inferno” passa-se no purgatório onde o Diabo e o Anjo negociando para ver quem é que ia para a barca do Diabo rumo ao Inferno e quem ia na barca do Anjo rumo aos céus, sendo a historia desta obra baseada nesse julgamento e na diversidade dos episódios, cada um dos personagens são completamente diferentes um dos outros e os seus motivos de julgamento também. Nas obras de Gil Vicente é muito comum a critica à sociedade e os problemas que abrangiam a mesma na altura, mais concretamente a igreja por a mesma falar muito no que se pode ou não fazer e muitos membros do clero entre outros desrespeitarem as regras da mesma, isso por exemplo no episodio do frade representante da Igreja, que vai para o inferno. Isso porque ele tinha uma amante, Florença, e não seguiu os princípios do catolicismo.

2. Episódio do judeu

(Vicente, Biblioteca Digital - Auto da Barca do Inferno, 2019)

“Tanto que Brízida Vaz se embarcou, veo um Judeu, com um bode às

costas; e, chegando ao batel dos danados, diz:

Judeu — Que vai cá? Hou marinheiro!

Diabo — Oh! que má hora vieste!...

Judeu — Cuj'é esta barca que preste?

Diabo — Esta barca é do barqueiro.

Judeu — Passai-me por meu dinheiro.

Diabo — E o bode há cá de vir?

Judeu — Pois também o bode há-de vir.

Diabo — Que escusado passageiro!

Judeu — Sem bode, como irei lá?

Diabo — Nem eu nom passo cabrões.

Judeu — Eis aqui quatro tostões e mais se vos pagará.

Por vida do Semifará que me passeis o cabrão!

Querês mais outro tostão?

Diabo — Nem tu nom hás de vir cá.

Judeu — Porque nom irá o judeu onde vai Brízida Vaz?

Ao senhor meirinho apraz?

Senhor meirinho, irei eu?

Diabo — E o fidalgo, quem lhe deu...

Judeu — O mando, dizês, do batel?

Corregedor, coronel, castigai este sandeu!

Azará, pedra miúda, lodo, chanto, fogo, lenha, caganeira que te venha!

Má corrença que te acuda!

Par el Deu, que te sacuda coa beca nos focinhos!

Fazes burla dos meirinhos?

Dize, filho da cornuda!

Parvo — Furtaste a chiba cabrão?

Parecês-me vós a mim gafanhoto d'Almeirim chacinado em um seirão.

Diabo — Judeu, lá te passarão, porque vão mais despejados.

Parvo — E ele mijou nos finados n'ergueja de São Gião!

E comia a carne da panela no dia de Nosso Senhor!

E aperta o salvador,e mija na caravela!

Diabo — Sus, sus! Demos à vela!

Vós, Judeu, irês à toa, que sois mui ruim pessoa.

Levai o cabrão na trela! “



3. Análise do episódio do judeu

Neste trabalho escolhi a personagem Judeu para aprofundar. No episódio do Judeu, o mesmo trás com ele um bode às costas pelo o facto de ser ritual dos judeus o sacrifício dos animais. O Judeu não quer deixar o bode no cais pois quer ser reconhecido como judeu e não recusa a sua religião.

O Parvo que já estava no cais de um episodio passado acusa o mesmo de roubar o bode, de cometer varias atrocidades à religião católica entre elas comer carne em dia de Nosso Senhor (argumento de acusação).

O Judeu para tentar entrar na barca com o bode oferece dinheiro ao Diabo, mas como este recusa, o Judeu reage com ofensas ao diabo, depois disso procura pela outra barca onde o também o rejeitam por urinar numa igreja e comer carne em dias santos. Por fim o diabo aceita levar o judeu para o inferno, mas numa embarcação à parte pelo facto de não merecer ir na mesma embarcação que os outros católicos. Neste episódio observamos dois tipos de comédia, uma de linguagem (usa uma gíria, um palavrão) outro de situação (não entra na Barca e vai a reboque).

Neste episódio também é usada linguagem popular, o calão “filho da cornuda”, é usado a ironia (na conversa com o diabo e o judeu), perífrase “ao senhor meirinho apraz”, imperativo “ vós judeu irês á toa, que sois mui ruim pessoa. “

4. As intenções da critica no episódio do judeu

A principal critica feita neste episódio era descriminação social vivida naquela altura pela a sociedade Judaica, e pela distancia em relação ao Cristianismo Católico.

Após a personagem Brízida Vaz condenada por prostituição e feitiçaria que acaba de embarcar com o Diabo, é a vez do judeu, que chega acompanhado por um bode (expiatório[1]), querendo expiar os seus pecados.

Encaminha-se direto ao diabo, pedindo para embarcar, mas até o diabo recusa-se a levá-lo. Ele tenta subornar o diabo, porém este, com a desculpa de não transportar bodes, aconselha-o a procurar outra barca. O judeu tenta falar então com o anjo, porém não consegue aproximar-se dele: é impedido, acusado de não aceitar o cristianismo.

Por fim, o diabo aceita levar o judeu e seu bode, mas não dentro de sua barca, mas, sim, rebocados.

Este episódio faz-nos pensar no anti-ssemitismo[2], tema atual e especialmente debatido pelo ódio aos judeus durante a segunda guerra mundial.

Assim temos de entender, na época do reinado de dom Manuel, de 1495-1521, muitos judeus foram expulsos de Portugal, e os que ficaram, tiveram de se converter ao cristianismo, esta era essa mesma critica à sociedade neste episódio.


Conclusão

Neste trabalho consegui aprofundar os meus conhecimentos nos assuntos referidos. Consegui perceber melhor quem foi GIL Vicente, o que fez e qual foi a sua importância e desempenho e na história da literatura portuguesa. Também consegui perceber melhor o contexto em que se situava a obra, as suas consequências, o real problema da podridão da social vivida naquela altura que os nossos antepassados enfrentaram na altura e como lidavam com isso.

A pesquisa foi maioritariamente na internet com palavras chaves como #GilVicente e o #Autodabarcadoinferno nos tópicos de pesquisa.

Bibliografia consultada

Suporte Digital

Frazão, D. (31 de 12 de 2019). eBiografia. Obtido de https://www.ebiografia.com/gil_vicente/

Vicente, G. (2017). Auto da Barca do Inferno. Em G. Vicente, Auto da Barca do Inferno. A Bela e o Monstro.

Vicente, G. (2019). Biblioteca Digital - Auto da Barca do Inferno. Em G. Vicente, Biblioteca Digital - Classicos da Literatura Portuguesa (pp. 26-27). Porto Editora.

Wikipedia. (31 de 12 de 2019). Auto da Barca do Inferno. Obtido de Wikipedia.org: https://pt.wikipedia.org/wiki/Auto_da_Barca_do_Inferno

WikiPedia. (14 de 12 de 2019). Gil Vicente. Obtido de https://pt.wikipedia.org/: https://pt.wikipedia.org/wiki/Gil_Vicente

Suporte Físico

· Material da Disciplina;

· Vicente, G. (2017). Auto da Barca do Inferno. Em G. Vicente, Auto da Barca do Inferno. A Bela e o Monstro.

Obras Citadas

Frazão, D. (31 de 12 de 2019). eBiografia. Obtido de https://www.ebiografia.com/gil_vicente/

Vicente, G. (2017). Auto da Barca do Inferno. Em G. Vicente, Auto da Barca do Inferno. A Bela e o Monstro.

Wikipedia. (31 de 12 de 2019). Auto da Barca do Inferno. Obtido de Wikipedia.org: https://pt.wikipedia.org/wiki/Auto_da_Barca_do_Inferno

WikiPedia. (14 de 12 de 2019). Gil Vicente. Obtido de https://pt.wikipedia.org/: https://pt.wikipedia.org/wiki/Gil_Vicente

[1] A expressão "bode expiatório" teve sua origem no dia da expiação, como relata a Bíblia. O dia da expiação, era um ritual para purificação de toda nação de Israel. Para a cerimonia, eram levados dois bodes, onde um deles era sacrificado e o outro, o bode expiatório, era tocado na cabeça, pelo sacerdote, que confessava todos os pecados dos israelitas (Judeus) e, os enviava para o deserto, onde todos os pecados eram aniquilados. [2] A palavra anti-semitismo significa preconceito contra ou ódio aos judeus.

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